A ameaça da praga monília às lavouras de cacau e os esforços para conter a disseminação do fungo foram tema de audiência pública da Comissão de Agricultura (CRA) nesta quarta-feira (11). Entre outras reivindicações, os debatedores pediram um esforço integrado na supressão da praga, agilidade no uso de recursos públicos e campanhas educativas para dificultar a circulação de cacau contaminado.
A audiência pública atendeu a requerimento ( REQ 17/2025 — CRA ) do presidente do colegiado, senador Zequinha Marinho (Podemos-PA). Na abertura do debate, Zequinha argumentou que o fungoMoniliophthora roreri— disseminado em outros países da América do Sul — tem alto potencial destrutivo na cultura de cacau, o que põe sob ameaça uma cadeia produtiva de grande importância econômica, social e ambiental. O agente causador da praga foi encontrado no Brasil pela primeira vez em julho de 2021, no Acre.
— Após quatro anos da presença na praga no Brasil, ela se encontra restrita às áreas não comerciais e urbanas em parte do Acre e do Amazonas — explicou.
Vice-presidente da Associação Nacional dos Produtores de Cacau (ANPC), Eunice Gutzeit classificou a monilíase como “ameaça real e crescente”. Ela elogiou os esforços da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac) para o controle da praga, mas ressalvou que ainda há muito a fazer.
— Teremos em breve o Festival do Chocolate em Altamira [PA], e não temos nenhum protocolo fitossanitário. Pessoas vindasmas do Acre ou do Amazonas podem chegar, eventualmente, trazendo frutos. Realmente, o risco é enorme.
Entre outras medidas, Eunice Gutzeit sugeriu o lançamento de campanhas educativas, o desenvolvimento de cultivares resistentes à monilíase e a criação de um plano de contingência emergencial coordenado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
A presidente da ANPC, Vanuza Lima Barroso, destacou a importância do Brasil para suprir o déficit internacional de cacau. Ela repercutiu denúncia sobre o “abandono” das ações de controle da monilíase no Alto Solimões em 2024 e pediu que as normativas do Mapa no enfrentamento da praga sejam adaptadas à realidade dos pequenos produtores.
— É uma doença devastadora e, se chegar aos principais estados produtores, é o fim da cacauicultura brasileira.
Coordenador-geral de proteção de plantas do Mapa, Ricardo Hilman pontuou que a instrução normativa do plano nacional de prevenção contra a monília entrou em vigor em 2020, antes da chegada do fungo ao Brasil, e toda a sociedade poderá contribuir com o aprimoramento da norma. Em sua avaliação, o plano foi um sucesso, possibilitando a detecção precoce da monília durante a pandemia de covid e as ações de supressão da praga.
Hilman também explicou a redução das ações no Alto Solimões em 2024 e assegurou que os esforços foram retomados.
— Quem é daquela região sabe que, no final do ano passado, teve uma seca muito grande, e todo o nosso trânsito lá é com barco. (…) Concomitantemente a isso, encontramos outro foco em Urucurituba, a 1,2 mil quilômetros da fronteira. (…) Seguramente alguma pessoa levou um fruto.
Paulo Lima, gerente do Programa Amazônia da Fundação Solidaridad — organização civil de apoio a produtores, com atuação em 52 países — associou a preservação da produção de cacau com a redução do desmatamento. Ele disse que a monilíase pode levar a perdas de 70% a 100% da produção de cacau, gerando um forte impacto na renda das famílias produtoras.
— Há uma carência muito grande de informação e capacitação dessas famílias em relação à convivência com o fungo, a manejos mínimos fitossanitários, para garantir uma produtividade satisfatória comercialmente caso a monília entre no estado do Pará.
A coordenadora-geral de pesquisa e inovação da Ceplac, Karina Peres Gramacho, explicou a forma de disseminação doMoniliophthora roreri, alertando que nenhuma região cacaueira está livre do risco. Ela mostrou os resultados de parcerias da Ceplac com pesquisadores internacionais no enfrentamento da praga, mas alertou para a importância da extensão rural e da conscientização maciça dos produtores.
— A monilíase só será controlada se várias medidas de controle forem empregadas: controle químico, controle biológico, controle cultural. É um sistema complexo.
Auditor fiscal da Ceplac no Pará e no Amazonas, Paulo Albuquerque citou os outros debatedores para assegurar que há ferramentas adequadas sendo aplicadas no controle de pragas, mas que a efetividade das medidas depende de previsões orçamentárias adequadas. Para ele, a monilíase não representará o fim da cacauicultura.
— É um grande desafio, mas se continuarmos com o trabalho (…), também vamos vencer esse desafio.
O senador Beto Faro (PT-PA) cobrou a realização de concurso público para reforçar o quadro de pessoal da Ceplac. Ele citou o aumento do número de pessoas que vão para a atividade do cacau em seu estado, mas lamentou que o conhecimento sobre a monilíase nessa população ainda seja baixo.
— Não percebo nessas pessoas essa preocupação: parece que ainda não existe a doença. Precismos fazer uma grande campanha de informação.
Chiquinho do Cacau, extensionista da Emater de Rondônia, disse que a informação é a maior arma dos cacauicultores para a preservação de sua lavoura e criticou os “empecilhos” que dificultam o acesso dos agricultores ao crédito. E Pedro Santos, técnico da Fundação Solidaridad, acrescentou que o foco dos esforços deve ser proteger o produtor.
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